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"Un lugar llamado Oreja de perro" reseñado

Por 27 de agosto de 2011 Sin comentarios

Iván Thays

carátula del libro en versión portuguesa
Mário Rufino reseña la edición portuguesa de Un lugar llamado Oreja de perro, editada por los jóvenes de Eucleia editores. Lo hace en el blog PNET Literatura. Muy agradecido.
Dice la reseña:

?Cheguei à conclusão de que o pior que nos podia acontecer era acostumarmo-nos à morte, à impunidade, ao horror, ao mal? pag.19   I Iván Thays constrói um cenário de silêncio, de melancolia e afastamento emocional a tudo o que rodeia o personagem principal. O jornalista em plena decadência profissional e destruído emocionalmente por uma perda irremediável é enviado para uma aldeia pobre, assistida por caminhos quase intransitáveis, que se prepara para assistir a um acontecimento que o jornalista adjectiva como ?ridículo intento populista de um presidente que já se vai do governo e cujo partido não tem nenhuma oportunidade nas eleições? pag.15 O presidente é Alejandro Toledo Manrique. Se acompanhamos o caminho de perda, de deterioração emocional do protagonista, fazemo-lo dentro do contexto sociopolítico do Perú. O Presidente Toledo prepara-se para ser substituído na presidência por Alan García Perez, outrora presidente no período de 1985-1990 e substituído, então, pelo controverso Fujimori. Dez anos depois, em 2000, Fujimori viria a exilar-se no Japão, após inúmeros escândalos, e renunciar à presidência. Fujimori viria a ser acusado e condenado por violação dos direitos humanos. É em 2001, após um período de transição, que Alejandro Toledo Manrique é nomeado presidente com uma elevada taxa de popularidade. No momento em que o jornalista se desloca a ?Oreja de Perro?, Toledo cumpre o seu último ano de mandato (2001-2006), tem um índice de popularidade muito baixo, e prepara-se para ser substituído. O jornalista viaja para ?Oreja de Perro?. Enquanto a recém-constituída ?Comissão da Verdade?, liderada por um professor universitário e filósofo (ou seja, liderada pela teoria), procura o que anuncia ? a verdade – o objectivo do jornalista é diferente:   ?a mim, o tema que atraía era o do mal. Quer dizer: é isto o ser humano?» pag. 17    A viagem não implica, somente, deslocação física, mas também alteração anímica. Durante o seu percurso, sabemos do desmoronamento do seu casamento através de uma carta deixada pela esposa, da degradação da situação profissional e da dor provocada pela perda do seu filho.   ?Começam os primeiros sintomas do mal das montanhas. Dor de cabeça, náuseas, esgotamento, olhos inchados, a indomável carta resplandecente, lábios secos, palpitações nas têmporas. O estômago que se desloca lentamente em círculos. Insónia, não. Insónia, não posso permitir.? Pag.33   Tudo menos a consciência. A consciência implica pensamento, interacção, memória, dor. E a memória é um elemento fulcral no livro de Iván Thays. ?Oreja de Perro? é um tempo suspenso, um purgatório, na transformação do principal personagem do livro. O local sublinha a solidão e, como o próprio jornalista afirma, o barulho das moscas aumenta a sensação de clausura. ?Oreja de Perro? é um pequeno lugar, de que, provavelmente, ninguém ouvira falar até a ?Comissão da Verdade? o mencionar no seu parecer como palco de atrocidades. Nesse parecer é mencionado a existência de valas comuns e clandestinas. Os ronderos (patrulha camponesa; força de segurança baseada na comunidade) teriam sido os únicos a derrotar o terrorismo sem qualquer ajuda da polícia. Aliás, a localidade não havia sido visitada por qualquer força da autoridade.   ?Nunca uma autoridade chegou até cá. Nem sequer um tenente alcaide. Agora o próprio presidente Toledo escolheu a zona para iniciar um programa de distribuição de dinheiro para camponeses? pag.15   Scamarone, o fotógrafo, é o seu companheiro de viagem. Segundo o jornalista, não há qualidade humana que recomende o seu colega. Cínico e detentor de uma retórica de sucesso, Scamarone é descrito como um indivíduo muito baixo, menos de 1,50m, capaz de convencer toda a gente que não era anão. A verborreia com que presenteava os seus interlocutores (ou ouvintes?), sobre viagens e com citações sem sentido, tinha o poder hipnótico sobre quem ouvia. A estatura do fotógrafo é uma metáfora sobre a estatura moral. No entanto, o cinismo de Scamarone terá um papel relevante na saída do limbo em que o jornalista caiu. Ele irá influenciá-lo a recusar a fuga, a dormência emocional, através de uma relação amorosa que, à partida e tal e qual acontecera com Mónica (esposa), se encontra condenada.   II   ?Fui eu que permaneci enclausurado na sua morte? pag. 104   No dia em que parte para ?Oreja de Perro?, o jornalista lê a notícia do homem que havia ficado amnésico após um trágico acidente que vitimara a mulher e o filho. Ele tivera oportunidade de o entrevistar e, em consequência, perceber o vazio da sua memória. Durante a sua estadia na aldeia, ele nunca esquece a situação desse homem. Por isso, algum tempo mais tarde, tenta convencer o Editor do seu jornal a deixá-lo entrevistá-lo, novamente. Tinha passado um mês e, devido à velocidade da informação, esse acidente pertencia a um passado distante. O autor apresenta-nos outro tipo de esquecimento. Já não é aquele que a quantidade de tempo ?enterra?, mas um outro tipo de esquecimento: a velocidade de informação nova submerge a mais antiga Na segunda entrevista, o homem afirma não ocupar a sua memória com factos do passado, mas com informação recente, mais ou menos relevante, como citações de Shakespeare ou língua chinesa. Ele contou-lhe o que a professora de chinês lhe havia dito quando se lamentou pela falta de memória: (?) Não tens que lamentar-te pela amnésia. A memória é uma espia. Tu conseguiste livrar-te dela, conseguiste extraviar-te da tua espia? pag.90   Sem memória tudo desaparece: o filho, a história, as emoções, a aprendizagem. E tudo se repete, renovadamente. O jornalista e o país precisam de recordar, de não esquecer a sua história de forma a construir um futuro com menos vícios do passado. A memória, no livro de Thays, é indissociável da culpa e da forma como se pode lidar com ela. O jornalista parte para ?Oreja de Perro? carregando o peso da sua memória. Tal como o país, ele está preso ao passado e tem muitas feridas por sarar. A violência no Peru, como em todos os locais, alimenta-se do medo e envolve as suas raízes na ignorância:   ?A tua mãe sabe ler?, perguntou-me um dia o polícia. Sim, sabe, respondi. É professora Isso é fodido, disse ele. Saber ler nestes sítios é fodido? pag.185   Muitas pessoas foram raptadas pelos militares para serem interrogadas, torturadas e mortas. Mas ele não se deslocou até ali por causa desse sofrimento, mas para escrever sobre o acontecimento político. E o paralelismo entre o país e o personagem não cessa com a incapacidade de esquecer o passado e construir um futuro: A escrita da carta de resposta à esposa e a chegada do presidente Toledo são dois acontecimentos por realizar. Tudo é constantemente adiado. Ambas as situações, ao acontecerem, implicam a tangibilidade do presente, a concretização da realidade que o personagem individual (jornalista) e a personagem colectiva (povo) sabem ser inevitável. A imparcialidade/distância é colocada em causa quando ele se envolve com Jazmín, natural de ?Oreja de Perro?, grávida devido à (hipotética) violação por um sargento. A miscigenação da população com a atrocidade militar é, assim, concretizada numa geração futura. Ele sabe que a sua envolvência com Jazmin não pode ser duradoura, e prenuncia: ? Seria mais fiel dizer que Jazmín é, e isso nota-se a léguas, uma dessas raparigas a quem vai suceder alguma coisa na vida. Ou melhor, como tinha dito o meu pai, uma rapariga de que há que fugir de imediato porque depressa se meterá numa alhada? pag.39 Jazmín assumia ser a mãe e o pai daquela criança. Nada queria da figura militar que havia raptado e torturado e morto a sua mãe (ascendência).     III ?O antónimo ideal da memória deve ser a imaginação, fantasiar, fazer ficção. Não a amnésia?   O caminho para a aceitação, para a Verdade, é um caminho difícil e talvez utópico tanto para o personagem individual (jornalista) como para o personagem colectivo (o país) Iván Thays utiliza uma prosa seca de adjectivos, com frases curtas, que nos remete para a escrita jornalística. A utilização de apontamentos, que ele escreve no seu caderno, é um recurso narrativo que confirma essa vontade de manter o registo jornalístico. Ao longo do livro, deslocamo-nos para um mundo com características próprias: Uma grávida que fala com os anjos e antevê o futuro, o acidentado que memoriza Shakespeare. Mas, sobretudo, somos transportados para um mundo que necessita de redenção, de um recomeço, de não esquecer a sua história, mas ultrapassar as dificuldades e despertar com lucidez para um novo dia.   O mais arrepiante não é a foto. O mais arrepiante é que, quando a tirei, a ninguém importava um caralho que uns cães estivessem a comer os miolos dos mortos. Não era foto nem para primeira página, não era nada, estávamos acostumados a isso. Isso era o que me dava medo? Pag.222   ?Oreja de Perro? pode ser o cão violentamente pontapeado pelo militar e defendido timidamente pelos populares, ou pode ser, pelo contrário, o cão magro e de cauda cortada que se passeia defronte do jornalista parecendo que se ri até o jornalista pensar, animado, que as coisas não têm de ser tão más. Podem ser melhor.Mário Rufino

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Iván Thays

Iván Thays es escritor peruano (Lima, 1968) autor de las novelas "El viaje interior" y "La disciplina de la vanidad". Premio Principe Claus 2000. Dirigió el programa literario de TV Vano Oficio por 7 años. Ha sido elegido como uno de los esccritores latinoamericanos más importantes menores de 39 años por el Hay Festival, organizador del Bogotá39. Finalista del Premio Herralde del 2008 con la novela "Un lugar llamado Oreja de perro".

Obras asociadas
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